Artigo – Guerra aos pobres

  • 22 de fevereiro de 2018
  • Artigo

Derrotado, por ora, na sua guerra ao direito à aposentadoria dos trabalhadores, Temer declarou guerra aos pobres favelados do Rio. Sim, é disso que se trata. Basta ler as declarações do Ministro da Justiça: “Em algum momento vai morrer gente, não há guerra que não seja letal”; “Como saber desses 1,2 milhão de pessoas entrando e saindo das 700 favelas cariocas quem é do seu time e quem é contra?”; “Você vê uma criança bonitinha, de 12 anos de idade, entrando em uma escola pública, não sabe o que ela vai fazer depois da escola”. Mais claro, impossível!

Vídeos de organizações negras e de favelados têm orientado a população negra e favelada a evitar o uso de guarda-chuva longo e furadeira elétrica para não serem confundidos com fuzil e metralhadora. Acha bobagem? A recomendação baseia-se em fatalidades ocorridas.

Suspeita a operação nas favelas do Rio, estado cuja taxa de homicídios é de 37,6/100 mil, se há dez estados com taxa superior, inclusive nosso vizinho Goiás. Para o colunista Duvivier, “governos americanos impopulares escolhem um inimigo externo para desviar a atenção dos eleitores. Temer escolheu os ‘iraquianos’ aqui mesmo, pelo nível de renda e cor da pele”. Os “manifestoches” certamente discordarão, mas o aumento da criminalidade é razão direta do aumento da pobreza e da percepção da desigualdade social.

E enquanto desvia a atenção para a “guerra nas favelas”, o governo pauta uma extensa agenda visando agradar o mercado, insatisfeito pela retirada de pauta da Reforma da Previdência: privatização da Eletrobrás; reforma do PIS/COFINS; extinção do Fundo Soberano (para cobrir rombo fiscal); e lei geral das agências reguladoras e de licenciamento ambiental.

Duvivier questiona por que fuçar as favelas cariocas se nenhuma delas esconde tanta cocaína quanto a encontrada em helicóptero de certo senador. Talvez a explicação esteja na charge de Duke: “Por onde começar a intervenção, presidente? Pelo morro do Tuiuti”.


JÚLIO MIRAGAYA, conselheiro do Conselheiro Federal de Economia, foi presidente da autarquia em 2016/17

Artigo publicado na edição de 22/02/2018 do Jornal de Brasília.