Por que o PIB brasileiro cresce a taxas tão baixas? A relação entre a imagem Z e o domínio

  • 16 de novembro de 2017
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A Constituição Brasileira de 1988, a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000) e a Resolução 43/2001 do Senado Federal regulam a maior parte da matéria: endividamento dos municípios, estados e a união. De certa forma, esta legislação humanizou a relação entre governo e contribuinte no Brasil. Antes a ideia reinante era de que o estado não tinha restrição orçamentaria, não havia responsabilidade fiscal. Os gastos públicos eram vistos como ilimitados, mas toda matéria tem limite, só as coisas do espirito é que são ilimitadas. Vivíamos uma situação de ilusão política, econômica e filosófica de que o estado podia tudo, o que o economista Maílson da Nobrega chama de incontinência orçamentária.

A relação entre a imagem Z e as variáveis Carga da Dívida Pública e própria Dívida Pública demonstra isso: que o governo tem responsabilidade com a sociedade e com a economia, e não apenas com rentistas, e que o custo da dívida pública, a imagem, não pode ser igual a contradomínio da função (a lei que une os dois conjuntos distintos será estabelecida por aplicação estatística ou econométrica). O contradomínio da função, sendo a imagem um subconjunto, se a economia fosse uma ciência exata e não uma ciência política e social, pertence aos números reais e variaria de menos um (-1) a (1).

No trabalho em PDF na internet de Ana Carla Bliancheriene e Renato Jorge Brown Ribeiro: A questão do endividamento público dez anos após a publicação da LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL, em 2010, faz uma análise exaustiva e atual sobra a legislação do endividamento público no Brasil. A resolução 43/2001 do Senado Federal demarca com clareza o limite do custo da dívida – imagem Z – para estados, Distrito Federal e municípios, no seu artigo 7: “O comprometimento anual com amortizações, juros e demais encargos da dívida consolidada, inclusive relativos a valores a desembolsar de operações de credito já contratados e a contratar, não poderá exceder a 11,5%”.  Em outra parte, na LRF 101/2000, a dívida consolidada liquida dos estados, do distrito federal e dos municípios, não poderá exceder:

  1. No caso dos estados e do distrito federal a 200% a Receita Corrente Liquida;
  2. No caso dos municípios a 120% da Receita Corrente Liquida.

Aqui, a legislação está limitando uma das variáveis do domínio da função orçamentária, no caso, a Divida Pública (DP): Z=f(CDP. DP), para os entes federados hierarquicamente inferiores à União. O espirito da lei está correto, mas há deficiência técnica na lei ao não levar em consideração quatro premissas básicas:

  1. Que o sistema financeiro nacional é um bloco monolítico, portanto não há competição entre as entidades privadas e públicas (essencialmente entre os bancos);
  2. Que não há taxa de juros envolvidos no estoque da dívida;
  3. Que não há tempo nas transações financeiras;
  4. Que não há sistema de amortização diferente do PRICE, portanto, o vetor de desembolso mensal ou anual da dívida são iguais. Quando na realidade, após 1996, nós demonstramos isso no livro Modelo Geral de Sistema de Amortização, ed. Valci, DF. Esse desembolso pode ser uma linha reta (PRICE), uma linha decrescente (PRICE-S) ou uma linha crescente (PRICE-L)de valores.

Ao não considerar essas premissas a LRF igualou o valor futuro ao valor presente para o estoque da dívida dos estados, municípios e do Distrito Federal. O valor futuro de um certo estoque de dívida é igual ao seu valor presente se as quatro premissas acima forem verdadeiras. Para que os municípios, os estados e o Distrito Federal se beneficiem do avanço da ciência financeira e de alguns conceitos básicos da engenharia financeira, a legislação precisa levar em consideração que essas premissas sejam falsas. Portanto, é verdade que quanto menor a taxa de juros, maior o valor presente. Quanto maior a competição entre os bancos, menor a taxa de juros. Quanto menor o prazo, menor o valor presente. Tudo para o mesmo valor futuro. Veja a tabela abaixo, nos sistemas de amortização PRICE, PRICE-L e PRICE-S, o valor futuro é o mesmo, R$ 5.523,56 e o valor presente também R$ 5.000,00. Para uma taxa de juros de 10% ao ano, num prazo de 12 meses.

   

Cálculo do Valor Futuro- Método Longo

   

Valor presente de R$ 5.000,00, em 12 meses, taxa de juros de 10% ao ano

 

no Price e um diferencial de 10% no Price-L e no Price- S.

   

Prazo

Coef. Apli

Pres.Price

Pr.Price-L

Pr.Price-S

   

11

1,0965

481,59

433,43

529,75

     

10

1,0865

477,61

437,74

516,2

     

9

1,0775

473,66

442,21

502,94

     

8

1,0686

469,75

446,85

489,97

     

7

1,0598

465,87

451,66

477,27

     

6

1,061

462,02

456,64

464,84

     

5

1,0423

458,2

461,81

452,68

     

4

1,0337

454,41

467,15

440,77

     

3

1,0252

450,66

472,69

429,13

     

2

1,0167

446,93

478,43

417,73

     

1

1,0083

443,24

484,37

406,58

     

0

1

439,57

490,52

395,66

     
   

5523,56

5523,56

5523,56

     

Fonte: Modelo Geral de Sistema de Amortização

     

Carlos Magno Lopes da Silva, Ed. Valci, 1996

     

Em resumo, a legislação deveria ser reescrita no sentido de se adequar à realidade do sistema financeiro nacional que é forte e consolidado e aos avanços da engenharia financeira. Em lugar de limitar o estoque da dívida, limitar-se-ia o valor futuro do estoque da dívida. O valor presente seria negociado pelos prefeitos, vereadores, governadores e deputados estaduais e distritais. Com certeza, atendendo ao interesse de cada ente federativo, irão procurar negociar o maior valor presente possível, a menor taxa de juros e um prazo razoável.

Quanto à União, as questões gerais do endividamento previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal aos entes da federação aplicam-se à União. Por exemplo, a Regra de Ouro do Orçamento Público a saber: se o ente público está se capitalizando ou se está se descapitalizando, no primeiro caso se utilizando de receitas correntes para custear despesas de capital, ou o contrário, está utilizando receita de capital para custear receitas correntes. Quanto ao limite do endividamento público, está em aberto com o argumento de que limitar o endividamento público da União limitaria as ações da política fiscal, monetária e cambial por meio das operações compromissadas, manutenção das reservas e cobertura de swaps cambiais. Há até um Projeto de Resolução no Senado Federal, 84/2007, do Senador Romero Jucá, que prevê um limite de endividamento para 3,5 vezes a Receita Corrente Liquida da União, mas o Poder Executivo não o tem apoiado. Por outro lado, a Carga da Dívida Pública (CDP) da União é uma coleção de indexadores, o que amarra a ação do Banco Central no controle da liquidez da economia e da inflação, e amarra por outro lado o Ministério da Fazenda no controle da Dívida Pública. Em setembro de 2017 o vetor de indexadores da dívida pública  estava assim distribuído

 

Indexadores da Dívida Pública Liquida do Setor Publico

 

Em Setembro de 2017

     

CAMBIAL

           

Interna

0,20%

         

Externa

-29,70%

         

TOTAL

-29,50%

         

IND.PREÇOS

         

IGP-M

2,90%

         

IGP-DI

0,00%

         

IPCA

27,90%

         

TOTAL

30,80%

         

SELIC

71,50%

         

TR

4,30%

         

TJLP

-21,00%

         

S/Remune

7,20%

         

Pre-Fixad

36,61%

         

T.GERAL

99,91%

         

Fonte: bcb.gov.br

         

As evidências empíricas mostram que é raro o momento em que a taxa de juros básica, a SELIC, encontra-se baixa e os índices de preços também se encontram em patamar aceitável, sob controle. O resultado histórico é que quando a taxa SELIC está baixa, os índices de preços no longo prazo cresçam, ou o pior dos mundos, a taxa SELIC está alta e os índices de preços em longo prazo estejam altos. De qualquer forma, a Carga de Dívida Pública alta compete com o sistema financeiro nacional, o volume da poupança interna. Quer dizer: menor a disponibilidade de recursos do sistema financeiro nacional a ser emprestado para famílias e empresas. A União, no afã de capturar a poupança nacional, oferece um cardápio variado de indexadores da dívida. Para o rentista, tudo bem, ela vai aplicar no melhor dos indexadores. Mas é péssimo para a administração da dívida pública. Ao contrário dos países mais adiantados na administração da dívida pública, o indexador dos títulos públicos é a taxa básica de juros. Que encontra-se próximo de zero nos EUA e Europa e até abaixo de zero como é o caso do Japão in JUROS, MOEDA E ORTODOXIA por André Lara Resende, Ed.Schwarcz. 2017, SP.

Se verificarmos o Resultado Primário do Setor Público, constatamos que de 2002 a 2015, o Brasil tem feito esforço sim, para alcançar Resultados Primários positivos. O Problema é que a Necessidade de Financiamento do Setor Público tem crescido o dobro a cada ano.

Tax de cresc. Acumulado 2002 a 2015

Média Geométrica ao ano

PIB acumulado

1,49

 

2,88%

   

NFSP acumulado

1,69

 

3,82%

   

Re Prim acumulado

1,26

 

1,66%

   

Fonte: para o pib, www.br.advfn.com

     

Fote: pra NFSP e Resultado Primario, www.tesouro.fazenda.gov.br

Enquanto o resultado primário cresceu 1,66% ao ano, a Necessidade de Financiamento do Setor Público cresceu 3,82 % ao ano de 2002 a 2015. Quando se abre a Necessidade de Financiamento do Setor Público, verificamos que a Necessidade de Financiamento da União é o dobro da Necessidade de Financiamento dos Estados, DF e Municípios. Quando se abre a componente JUROS, tanto da dívida da União quanto de Estados, DF e Municípios, verifica-se que a União de 2002 a 2009 em dezembro de cada ano, é responsável por 68% e a conta juros para os demais entes fica em 32%.

   

Componentes dos Juros na NFSP/PIB, em dez do ano

     

União

Est e Mun

total

 
   

2002

0,396552

0,603448

100,00%

 
   

2003

0,705744

0,294256

100,00%

 
   

2004

0,574661

0,425339

100,00%

 
   

2005

0,815468

0,184532

100,00%

 
   

2006

0,761696

0,238304

100,00%

 
   

2007

0,726678

0,273322

100,00%

 
   

2008

0,582117

0,417883

100,00%

 
   

2009

0,878788

0,121212

100,00%

 

Média juros/PIB

 

0,680213

0,319787

   

6,7225

   

4,572731

2,149769

   
   

Fonte: www.bcb.gov.br

   

Ou seja, a União é responsável pela taxa de crescimento de coelho da Necessidade de Financiamento do Setor Público, e a conta JUROS é a conta dominante. Seja através da Política Fiscal, seja através da Política Monetária. Trabalho realizado pelo IFI/ Senado Federal aponta que em agosto/2017, o Bacen comprometeu 56% em JUROS nas operações compromissadas. São R$ 648 bilhões de reais. Uma parte vai para o aumento da Dívida Pública, outra administra-se elevando-se os depósitos compulsórios dos bancos (públicos e privados) que hoje gira em torno de 7% do PIB. Um dos mais altos do mundo. Isso impacta negativamente na disponibilidade financeira para financiamento e empréstimos para empresas e famílias. E explica um dos maiores flagelos da economia brasileira. A taxa de juros na ponta, muito elevada. Afinal, quais fatores explicam as elevadas taxas de juros no Brasil, além dessas expostas?


Carlos Magno, Economista e Escritor